23 de
Novembro de 2017
A FEDERAÇÃO
NACIONAL DAS ASSOCIAÇÕES EM DEFESA DA SAÚDE MENTAL - FENAEMD vem a público
manifestar seu profundo repúdio às cenas apresentadas na Novela, exibida às 21
horas, pela Rede Globo de Televisão, “O Outro Lado do Paraíso”, de autoria de
Walcyr Carrasco, que foram ao ar no último dia 21 de novembro. Cenas que
contribuem para perpetuar o preconceito e para desinformar a sociedade em
relação aos padecentes de doenças mentais graves e aqueles que os cuidam e
tratam.
As cenas,
além de apresentarem a personagem Clara sofrendo delírios e alucinações
provocados por medicação psiquiátrica, como se um remédio fosse uma droga
psicodélica, também mostram os psiquiatras como corruptos (comprados),
sequestradores e sádicos, reforçando estereótipos que são altamente
prejudiciais dentro do contexto da Saúde Mental e dos tratamentos psiquiátricos.
Tratamentos esses imprescindíveis para salvar e recuperar vidas humanas, como
nos casos de surto psicótico e suicídio, que vem atingindo de forma alarmante a
nossa população.
Na
sequência, a personagem é internada de forma irresponsável e desnecessária em
uma instituição (médica, chamada de hospício!) e citado que ela nunca mais
sairia daquele local. Essa fala, além de ir contra a Lei 10.216/2001 que não
permite mais o hospital como equipamento asilar e de moradia, coloca todos os
profissionais de saúde que atuam na instituição, ou seja, médicos, enfermeiros,
psicólogos, assistentes sociais, como coniventes do sequestro. Esse é outro
desserviço à população, pois aumenta o medo e, novamente, o preconceito com
relação a internação e ao Hospital Psiquiátrico Especializado, um dos
importantes mecanismos utilizados para reequilibrar o indivíduo nos momentos de
crise e reinseri-lo na sociedade, para a continuidade do tratamento
extra-hospitalar.
Outro
fato, que demonstra profunda desinformação, é a abordagem de associar a tortura
ao procedimento de eletroconvulsoterapia(ECT), técnica utilizada pela
psiquiatria, de forma indolor e com anestesia, e que possui comprovação de sua
eficiência e eficácia através de diversos estudos científicos, em tratamentos
onde outras técnicas não surtiram efeitos.
Toda essa
forma de abordar e associar o tratamento em saúde mental, a maus tratos,
sequestro, corrupção, mesmo com as licenças literárias das novelas, provocam
prejuízos irreparáveis à população, trazendo desinformação e, ainda mais,
preconceito que o já existente, a psicofobia.
Não
consideramos válido qualquer argumento de que esta seja obra de ficção. A
ficção não pode atuar comprometendo o tratamento em saúde mental e causando
prejuízos a vidas humanas. Se o Sr. Walcyr Carrasco, que não apenas nesta, mas
em outras ocasiões, se mostrou verdadeiro carrasco de doentes mentais, famílias
e médicos, mostrasse outras minorias, como negros ou mulheres, em situações que
transmitissem preconceito, haveria imensas manifestações e mobilizações por
parte da sociedade.
A Globo
desmonta toda uma vida de dedicação e orientação por parte dos familiares das
pessoas com transtornos mentais que muitas vezes assumem sozinhos o cuidado dos
seus familiares, sem qualquer apoio do poder público. Remontar aos anos 70 é
direcionar o povo brasileiro no sentido de negar a importância do Psiquiatra, do
Hospital Especializado e do papel fundamental da psiquiatria. Tudo isso
colabora de forma irresponsável com a negação do tratamento seja medicamentoso,
seja de internação nos momentos de crise.
Como
representantes legítimos de pacientes e familiares, não ficaremos calados.
Faremos ouvir nossa voz por quaisquer meios que nos sejam legítimos. Somos
muitos. Muitos mais do que o preconceito do autor e da emissora imaginam.
Diante do
exposto, demandamos uma resposta pública da emissora e do autor.
DIREÇÃO DA FENAEMD-SM